Senti...

Você pede socorro e me mostra a noite. Me esforço para chegar bem lá no fundo e tocar um pouco do que já foi. Dói! Eu assisto impotente o seu abandono, sabendo que nada posso fazer para impedir que você se vá.

Queria te colocar nos ombros como fazia quando eu era pequena. Correr de mãos dadas e te mostrar o caminho da luz. Ver o teu sorriso, escutar os casos que me encantavam e já não existem mais. A roupa xadrez, a boina preta... as brincadeiras de barro e os olhos, cor difícil de descrever, que agora foram trocados pelo cansaço, a entrega e a raiva.

Eu sei porque pede ajuda...

Suas pernas não têm forças.

O seu coração já não bate por ninguém.

Não tem sorriso... não tem abraço.

Eu tento. ... mas não posso! Você se recusa e o tempo já não é seu amigo...

Ouço o timbre das canções quando embalava o meu sonho de criança. Sinto a sua mão pesada me balançar em pedaços de madeira... o gosto do doce que só nós dois comíamos escondidos... o mundo onde os nossos olhos tinham cores definidas, você não tinha medo e me pedia para ser forte.

Queria poder te mostrar um pouco dessas lembranças... segurar a sua mão e dizer palavras com olhar...

... mas não: o corpo fica, não sei ainda por quanto tempo, a alma já foi...

Te vejo em preto e branco! Sinto por isso...

Dói... dói aqui dentro.